O De-Para das organizações na criação de uma cultura de inovação em Saúde

Inovar pressupõe ouvir usuários e profissionais na busca por melhorias, utilizando a tecnologia como meio para o alcance de resultados tanto assistenciais quanto operacionais

O De-Para das organizações na criação de uma cultura de inovação em Saúde

O sistema de Saúde brasileiro enfrenta uma complexa realidade: ao mesmo tempo, em que uma parcela das organizações já utiliza tecnologias disruptivas, como inteligência artificial e internet das coisas, há aquelas que nem sequer possuem computadores.

Dados da pesquisa TIC Saúde 2018, referentes ao ano de 2017, apontam que 6% dos equipamentos de Saúde brasileiros não recorreram a computadores nos últimos 12 meses, enquanto 19% não utilizavam nenhum sistema eletrônico para armazenar informações dos pacientes.

Na Saúde Pública, o desafio é ainda maior: 12% das Unidades Básicas de Saúde (5.000, do total de 39 mil existentes) não possuíam computador em 2017 e 28% não contavam com acesso à internet (10,5 mil).

Mesmo entre as organizações com alta adoção de tecnologia, ainda existem muitas dúvidas sobre como construir uma cultura de inovação em Saúde eficiente, que identifica e propõe soluções para as dificuldades conforme o perfil de cada organização — imagine naquelas que têm baixa adoção. Esse mindset diferenciado entende que, mais que investir em uma determinada tecnologia, é preciso entender qual delas ameniza, de fato, as dores particulares da instituição e de seus usuários. 

O incentivo à inovação tem como propósito construir novos modelos de negócio, que substituam o foco no tratamento e cura de doenças por autocuidado e medicina preditiva. Um dos principais desafios desse “de - para” é criar uma metodologia de pensamento que mude o mindset dos profissionais que atuam nas organizações de Saúde brasileiras.

Quem afirma é Arthur Igreja, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialista em tecnologia e inovação.

"Cultura de inovação, acima de tudo, pressupõe colocar o usuário no centro dos negócios. Para tanto, é preciso entender a  jornada desse usuário com a organização, desde o momento que ele pensa em procurá-la até o pós-alta. Ao longo de todo esse caminho há, sem dúvida, diversos pontos a serem melhorados.” 

Igreja destaca a criação de um ambiente onde a proposta de inovar na Saúde tenha como meta a melhoria dessa jornada do usuário.

"Um caminho é trabalhar com pequenos produtos mínimos viáveis, os MVPs (Minimum Viable Product). Para tanto, deve-se escutar os pacientes, pois muitas vezes a resposta para os gargalos da Saúde está no usuário.”  Mas a gestão em Saúde também deve ouvir seus profissionais, garante o especialista.

“Os colaboradores devem sentir que têm abertura para trazer ideias. E ter a certeza de que não serão punidos caso errem. A Saúde lida com vidas, então, o erro é um complicador e tende a ser evitado a qualquer custo. Mas essa conduta não pode ser uma trava para a inovação.” 

O especialista da FGV destaca três passos fundamentais e práticos para a criação de uma cultura de inovação em Saúde: 

  • Passo 1: entender que muito da colaboração vem da base da pirâmide, das pessoas que têm o maior contato com o usuário final. Estimulá-las a colaborar, propor soluções, ouvi-las com atenção e, mais ainda, testar e implementar suas ideias. 
  • Passo 2: tornar a cultura de inovação na Saúde transversal. Não pode existir apenas um laboratório de inovação isolado, que não se comunica com os demais departamentos da instituição. Esse modelo cria nichos fora da realidade e dificulta alcançar o propósito de tornar a inovação parte da estratégia da instituição.
  • Passo 3: coletar o máximo de feedback possível. É preciso saber como o usuário está recebendo as novas ideias e entender se, de fato, aquilo visto como inovador pela organização resolve ou minimiza as principais dores da sua jornada. 

O setor tem particularidades que, segundo Igreja, são desafiadoras para o estímulo à Saúde Digital. Estruturas engessadas e hierárquicas, nas quais a informação pouco flui e onde se considera que um pequeno grupo de decisores são sábios e estão sempre certos, ainda são bastante comuns.

"As soluções surgem quando se derrubam as barreiras corporativas e há integração das áreas. Para encontrar a melhor resolução para o usuário, é preciso uma pitada de conhecimento médico, uma pitada de conhecimentos de TI, e por aí vai.

A Saúde tende, ainda, a ver a inovação como um custo, e relacioná-la diretamente à tecnologia. Mas o especialista garante que inovar é usar a tecnologia como meio para mudar o negócio. Larry Keeley, presidente e cofundador da Doblin Group, é autor do livro "10 tipos de inovação". Ele explica que há duas formas de inovar.

  • A primeira é melhorar o que já é conhecido, o que representa de 92% a 95% dos projetos de inovação nas corporações.
  • A segunda é inventar o novo, respondendo pelo restante das iniciativas e que, realmente, traz disrupção. 

Os resultados que podem ser alcançados com essa mudança de mindiset ficam evidentes em estudo da consultoria McKinsey & Company, que mostra que 75% das pessoas esperam utilizar serviços digitais no setor de Saúde do futuro. A pesquisa destaca, ainda, que hospitais conectados são 50% mais propensos a aumentar a participação no mercado e elevar as margens de lucro em comparação aos concorrentes sem acesso à tecnologia. 

O caminho é complexo, mas precisa ser percorrido. Enquanto o setor de Saúde não avançar em inovação, arrisca se afogar em modelos antigos, relações ultrapassadas e, mais que isso, ineficiência em garantir a saúde que a população quer e precisa.

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