4 impactos da telemedicina para a cultura organizacional e para o paciente

Como a tecnologia veio para ficar, cabe à gestão das instituições que a adotam planejar a usabilidade do novo modelo assistencial para melhorar a experiência de profissionais e usuários

4 impactos da telemedicina para a cultura organizacional e para o paciente

A necessidade de isolamento social que a pandemia nos impôs favoreceu a evolução da saúde digital. E a telemedicina, que é a ferramenta tecnológica mais conhecida nesse contexto, foi finalmente regulamentada para utilização em larga escala no Brasil. Agora, fica cada vez mais claro que seu uso deve se tornar uma atividade permanente mesmo após o controle da Covid-19, pois é benéfico tanto para pacientes quanto para as organizações de saúde. A ampliação do acesso é apenas um deles.

Com pouco mais de um ano de permissão da prática, a telemedicina transforma a cultura assistencial.

“Tradicionalmente, as aplicações mais comuns aconteciam em situações de distanciamento físico e geográfico, mas, nos tempos atuais, a principal limitação passou a ser o distanciamento social imposto pela pandemia e, com isso, os procedimentos de telemedicina ficaram voltados tanto para garantir o cuidado quanto para preservar a saúde do usuário do sistema”, avalia Paulo Mazzoncini de Azevedo Marqueschefe do Centro de Física Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP.  

Mas a telemedicina é muito mais do que consultas não-presenciais e se desdobra em diferentes modalidades reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Telediagnóstico, teleinterconsulta e teleorientação, são alguns exemplos e:

“Dessa forma, o atendimento presencial com o médico (ou com outro profissional de saúde) só precisaria acontecer quando as alternativas mediadas pelas tecnologias de informação e comunicação não forem realmente possíveis”, acredita o especialista.  

No aspecto tecnológico, os requisitos necessários de conectividade, protocolos de comunicação para troca de dados de maneira segura e eficiente, bem como as características essenciais dos sistemas de registro eletrônico em saúde, estão muito bem estabelecidos e são amplamente conhecidos pelos profissionais da área de informática em saúde.  

Mas, no que se refere aos recursos humanos necessários à prática, ainda é preciso reflexão. A qualificação do profissional que atuará nesse modelo de atividade clínica, por exemplo, é imprescindível para garantir um atendimento de boa qualidade.

“Eu entendo que a gestão em Saúde pode (e deve) se preparar para a prática segura e ética da telemedicina. E a dupla, tecnologia adequada e recursos humanos qualificados, é a única que pode garantir isso”, declara Marques.  

Para colaborar em ambos aspectos, o Ministério da Saúde criou em 2020 a Estratégia de Saúde Digital para o Brasil, um documento que vai ajudar a implantação desse novo modelo assistencial na Saúde Pública e prevê uma Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS) funcional e ativa até 2028 para a interoperabilidade de dados em saúde de todos os brasileiros.

“A proposta é muito ambiciosa, porém está muito bem estruturada. Apesar das dificuldades evidentes para a implantação de um modelo de Saúde Digital em um país tão grande e diversificado como o Brasil, a minha visão é bastante otimista, pois o conhecimento técnico para isso existe”, enfatiza o especialista.  

Conheça agora quais são os principais impactos da aplicação de telemedicina no processo clínico de cuidado e seus diferentes efeitos sobre a cultura hospitalar e a prática assistencial.

 

1. Aumento no número de atendimentos assistenciais, chegando a lugares remotos

A utilização da telemedicina fora dos grandes centros populacionais é viável e muito bem-vinda, desde que devidamente planejada e organizada segundo as necessidades de tecnologia e de recursos humanos. Por exemplo, mesmo sendo possível manter a conectividade via telefonia móvel usando SMS (Short Message Service) para otimizar alguns serviços simples, como marcação e confirmação de horários de consultas, os usos mais sofisticados, como de ferramentas de teleconferência com áudio e vídeo, exigem infraestrutura mais complexa e cara.

Nesse sentido, alguns projetos do governo federal visam garantir a conectividade até mesmo em regiões remotas do País:

“A Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), uma organização social vinculada e mantida pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, tem ampliado muito a sua capilaridade, chegando praticamente a todas as regiões brasileiras e isso tem possibilitado a ampliação do alcance de iniciativas já em funcionamento desde a primeira década dos anos 2000, como o Programa Telessaúde Brasil Redes, exemplifica Marques.

 

2. (Re)planejamento estratégico da gestão hospitalar

Além da infraestrutura, há questões de cultura organizacional que precisam ser moldadas para a nova realidade. Principalmente porque as mudanças de cultura são sempre muito complexas e multifatoriais, necessitando de um novo planejamento estratégico e de uma governança bem definida.

“Acredito que o Plano de Ação de Saúde Digital seja uma boa referência para essa discussão, pois aponta para sete prioridades, entre as quais eu destacaria novamente a Formação e Capacitação de Recursos Humanos para que se consiga uma evolução na cultura da gestão hospitalar para a transformação digital na Saúde”, recomenda o especialista

 

3. Formação complementar de todos os profissionais de saúde

Não basta colocar o médico na frente de um computador, com o paciente do outro lado, na frente de outro computador, e esperar que uma experiência de qualidade aconteça. É fundamental preparar o médico para essa nova forma de atividade profissional. Assim como é também imprescindível definir as situações de atendimento e tecnologias mais adequadas para cada modelo de interação remota.

“Considerando a complexidade da própria medicina, em conjunto com a complexidade do uso das tecnologias da informação, a minha tendência é considerar que, via de regra, os médicos ainda não estão realmente preparados para isso”, diz Marques.

Falta às escolas médicas brasileiras preparar seus estudantes para atuação profissional no ambiente da saúde digital e isso precisa ser corrigido.

 

4. Investimento na educação do usuário da telemedicina

Mas não adianta o profissional estar devidamente treinado para a telemedicina se o usuário do serviço, ou seja, o paciente, não quiser ou não puder utilizá-lo. Em ponto fundamental nesse sentido é garantir a usabilidade da ferramenta, possibilitando uma ótima experiência para o paciente, com segurança e efetividade. O primeiro passo para tal é garantir a conectividade nas duas pontas.

“É o nível dessa conectividade que possibilitará o uso de modalidades diferentes, desde o envio e recebimento de SMS até uma teleconferência com discussão de sinais vitais ou a interpretação de exames por imagem”, resume Marques. Uma vez que a conectividade está garantida, é preciso, então, educar o usuário.

“Entendo que, da mesma forma que no ambiente financeiro, na telemedicina quem deve garantir a qualidade e a segurança do processo é a instituição prestadora do serviço e o usuário precisa ser devidamente preparado para exigir e reconhecer um serviço de qualidade, bem como se proteger de situações ilegais e de mau uso de seus dados”, recomenda.   

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