O que é preciso para se tornar uma operadora de Saúde sem papel
Além de ferramentas de TI, abolir caneta e papel requer mudança de processos e cultura organizacional
Apesar do movimento rumo à Saúde Digital, há poucas operadoras de Saúde sem papel, ou paperless — aquelas que conseguiram abolir de vez o uso de fichas, vias e guias em papel —, no Brasil. Ter um ambiente informatizado não é suficiente para que a transformação ocorra: segundo especialistas, é necessária uma mudança de mentalidade.
Aimar Lopes, docente da pós-graduação em gestão hospitalar do Centro Universitário São Camilo, acredita que é necessário aliar o investimento em ferramentas tecnológicas à mudança de processos e à adoção da cultura digital.
“Retirar o papel deve ser uma decisão estratégica, que parte dos altos executivos da empresa para os demais funcionários. Só dessa forma é possível engajar os profissionais de todos os departamentos, do atendimento direto ao backoffice”, destaca.
Segundo o docente, a primeira etapa é mapear a trajetória do beneficiário no sistema de saúde, a fim de identificar quais processos utilizam papel e como alterá-los para que se tornem digitais.
Feito o levantamento, é hora de escolher as ferramentas de hardware e software que serão utilizadas, entre elas um sistema de autorização eletrônica com controle biométrico ou facial a ser disponibilizado à rede credenciada, evitando-se assim a necessidade de impressão de guias e coleta de assinaturas.
A adoção de um software de gestão também é indicada para a melhoria dos processos de todos os setores da operadora de Saúde, controlados e armazenados digitalmente.
Também se faz necessário, de acordo com o especialista, treinamento para que se saiba que forma realizar os registros no sistema informatizado, além de garantir os cuidados necessários para preservar a segurança das informações dos beneficiários.
Por fim, adotar a certificação digital é uma obrigatoriedade que auxilia na garantia jurídica dos documentos eletrônicos e oferece ganhos em segurança para médicos e pacientes da rede credenciada, uma vez que a otimização do processo garante a integridade da informação e dos procedimentos realizados.
Desafio da integração
Tornar uma operadora de Saúde sem papel inclui alterar também como ela se comunica com seus parceiros. Se não houver integração entre os sistemas utilizados pela operadora e sua rede, como fornecedores, hospitais, laboratórios e centros de medicina diagnóstica, abandonar o papel pode ser mais difícil.
“A integração é a chave do conceito de operadora de Saúde paperless. É preciso que as informações do beneficiário estejam disponíveis em todas as organizações de Saúde pelas quais ele passa. Sem essa integração, não é possível que a operadora autorize um exame para ser realizado em um laboratório terceirizado sem fazer uso do papel”, comenta Lopes.
Para o futuro, o especialista acredita que será necessário adotar padrões, por meio de legislações específicas, que deverão ser seguidos em toda a rede de serviços de Saúde.
“Isso já acontece em algumas empresas e instituições bancárias. Existem no Brasil, por exemplo, companhias de seguros que são totalmente paperless. A tendência é que o mesmo ocorra com as organizações de saúde”, explica.
O padrão Troca de Informações na Saúde Suplementar (TISS) já atende boa parte desses requisitos, mas não abrange a totalidade das mudanças necessárias.
Exemplo internacional
A operadora de saúde norte-americana Oscar Health é um exemplo de sucesso no conceito paperless. A empresa, que começou há apenas quatro anos, já vale quase R$ 6 bilhões. Nasceu em Nova York com foco no público jovem, acostumado a fazer tudo online. Oferece, inclusive, serviço via celular para saber, segundo os sintomas descritos pelos beneficiários, se eles devem marcar uma consulta e com qual especialista.
No aplicativo da operadora há também um buscador da rede credenciada que inclui avaliações dos médicos por outros pacientes e informações sobre esses profissionais, como, por exemplo, onde eles se formaram e interesses pessoais. O usuário ainda pode agendar uma consulta diretamente pelo aplicativo, entre outros benefícios.
O especialista do Centro Universitário São Camilo acredita haver espaço no Brasil para o desenvolvimento de operadoras de Saúde sem papel como a Oscar Health.
“É necessário realizar alguns ajustes na legislação e fazer investimentos, e sabemos que a crise financeira que assola o País pode dificultar um pouco esse processo. Mas aqueles que decidirem adotar o conceito de operadora sem papel sentirão no dia a dia as melhorias no processo de atendimento como um todo e a redução expressiva de gastos com papel”, garante.