Auditoria clínica apoia desospitalização
Modelo é apontado como um dos caminhos da gestão hospitalar para conter custo assistencial e, ainda, garantir qualidade e segurança da assistência dentro e fora da organização de Saúde
O custo anual das internações hospitalares na Saúde Suplementar brasileira avançou 5,2% entre 2014 e 2017. O percentual, proveniente do estudo “Custos em Saúde e o desequilíbrio em plano individual”, realizado pela Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), evidencia a necessidade de a gestão hospitalar elaborar estratégias para favorecer o cuidado integral da Saúde, e não apenas o tratamento de doenças. É esse modelo que ajuda a evitar agravos como internações, cirurgias e procedimentos complexos e, consequentemente, reduzir os custos com esses serviços, em geral, mais caros. Uma vez que eles ocorrem, porém, é preciso se preocupar também em como estimular a desospitalização.
Nesse sentido, um dos caminhos apontados por especialistas é a auditoria clínica. Também conhecida como auditoria hospitalar ou médica, a prática pode ser definida como um ciclo de melhoria assistencial que envolve a mensuração da eficácia dos cuidados de saúde, tendo como norteadores padrões comprovados de alta qualidade. Engloba, ainda, as ações necessárias para adequação a tais padrões, formando um sistema de aprimoramento para a gestão hospitalar nos modelos de prática clínica e, consequentemente, favorecendo a desospitalização. O modelo pode, inclusive, integrar estratégias amplas com foco no cuidado integral à saúde, evitando, assim, que o paciente seja novamente internado.
Flávia Colares, médica especialista em auditoria em Saúde e gerente de regulação da Caixa de Assistência à Saúde da Universidade Federal de Minas Gerais (Casu-UFMG), explica que, sendo um programa de governança clínica planejado, o intuito da auditoria clínica é ajudar a gestão hospitalar a monitorar e avaliar, objetivamente, o desempenho clínico de todos os profissionais envolvidos na assistência, identificando oportunidades de desenvolvimento e fornecendo mecanismos que otimizam a tomada de decisão. Ela favorece, ainda, a racionalização de custos e a segurança do paciente.
Entre os principais pontos avaliados pela auditoria clínica na gestão do hospital, Flávia destaca:
- Estrutura: Identifica a disponibilidade de prestadores de serviços em uma localidade, por exemplo;
- Processo: Avalia o tempo de espera para realização de um procedimento, entre outros;
- Resultado: Monitora o número de reinternações em determinado hospital;
- Adequação: Verifica se a assistência correta está sendo fornecida ao paciente correto;
- Oportunidade: Avalia se a assistência foi provida em momento adequado;
- Eficácia: Detalha se a assistência foi dada da maneira correta e com o efeito desejado;
- Eficiência: Monitora se a assistência foi realizada com pessoal e tempo adequados, sem despesas desnecessárias ou desperdício;
- Aceitabilidade: Verifica se a assistência é aceitável para o paciente;
- Acessibilidade: Detalha se há a devida facilidade em obter atendimento;
- Equidade: Identifica se a assistência está disponível para todos os pacientes de maneira imparcial.
“Em resumo, o objetivo da auditoria clínica é prover valor assistencial, isso é, obter os melhores resultados, sempre centrados no paciente, sob os melhores custos. Cuidados em maior quantidade, mais recentes ou mais caros não são, necessariamente, os melhores”, destaca a especialista.
Especificamente no âmbito da desospitalização, Flávia garante que o papel do auditor clínico é fundamental para a gestão hospitalar. Ele atua, proativamente, na identificação de pacientes com condições de serem beneficiados com a desospitalização.
“Assim, servindo como interface entre médico assistente, equipe multiprofissional e familiares, o auditor se torna ator central na viabilização do processo.” Segundo a médica, também cabe à auditoria clínica o monitoramento e prevenção das longas permanências no ambiente hospitalar. A especialista destaca a importância da desospitalização.
“Ela está associada à humanização, oferecendo aos pacientes uma recuperação mais rápida, próximo a seus familiares e entes queridos. Possibilita, ainda, a racionalização da utilização dos leitos hospitalares, impactando na média de permanência e beneficiando todos os demais usuários. Ao conter os desperdícios relacionados às permanências desnecessárias, ainda promove redução de custos, importantíssima para a sustentabilidade do setor.”
Por si só, a auditoria clínica na gestão do hospital exige enorme quantidade de dados. Nesse cenário, a especialista indica o uso de ferramentas como o Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP), computação em nuvem, big data, bulário online e sistemas de gestão hospitalar, entre outras, para otimizar o monitoramento dos indicadores, em especial os relacionados à qualidade assistencial.
Internação domiciliar
Flávia alerta que é papel também da gestão do hospital pensar em tecnologias que monitorem o paciente fora de seus limites, em internação domiciliar, por exemplo. A especialista destaca que novas tecnologias despontam como soluções para essa questão, tais como:
- Dispositivos de telemonitoramento que capturam sinais vitais ou sintomas e os relatam a um provedor remoto ou a um profissional de saúde;
- Sensores de leito que identificam interrupções do sono, pulso ou respiração durante o sono;
- Dispositivos que detectam quedas e também incluem sistemas de resposta a emergências, possibilitando que o paciente peça ajuda;
- Sistemas de câmeras que permitem o monitoramento remoto;
- Telemedicina para viabilizar atendimentos à distância;
- Sistemas de lembretes que alertam para horários das medicações;
- Sistemas com modelos tridimensionais em escala real de interiores de casas, integrados aos prontuários eletrônicos visando melhorar o planejamento da alta.
Todas essas tecnologias geram dados que abastecem a auditoria clínica, favorecendo o uso do modelo na desospitalização de outros pacientes. Mas a especialista deixa o alerta: para ser possível uma transição segura do cuidado hospitalar para o cuidado domiciliar, é essencial o engajamento de familiares e pacientes, fundamental em qualquer estratégia de desospitalização e de gestão do cuidado dentro e fora do hospital.