Realizar a checagem das rotinas em áreas cruciais do sistema de saúde, como a enfermagem, o atendimento médico e a farmácia hospitalar, pode ser a chave para combater eventos sentinelas.

Uma das inovações mais significativas na transformação dos sistemas de saúde é sem dúvida o Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP), que revolucionou a maneira como os dados médicos são registrados, acessados e compartilhados. Além de otimizar a eficiência operacional, o PEP também desempenha um papel crucial na prevenção e no combate aos eventos sentinela na saúde.

O que são eventos sentinela

Eventos sentinela são ocorrências graves e indesejáveis no ambiente de saúde que funcionam como indicadores de possíveis falhas sistêmicas e de segurança. Esses eventos, quando ocorrem, têm o potencial de causar danos significativos aos pacientes, familiares e à reputação das instituições de saúde. Eles são chamados de "sentinela" porque servem como sinais de alerta, apontando para questões subjacentes que exigem investigação e intervenção imediata.

“Cirurgias realizadas em pacientes trocados ou procedimentos com bilateralidade feitos em membros invertidos são alguns exemplos de eventos sentinelas que podem acontecer em um hospital, gerando danos ao paciente que podem ou não provocar sequelas”, descreve Rafaela Guerra, CMIO da Rede São Camilo.

Rafaela afirma que eventos sentinelas acontecem a todo momento em instituições de Saúde e no mundo inteiro, até mesmo nos países com a melhor assistência hospitalar possível:

“A maior causa de um evento sentinela é a falta de informação, seja pela falta de checagem na hora de um procedimento, pela incompreensão de uma mensagem de algum membro da equipe assistencial ou até pela falta de validação de um dado. Para combater o problema, os sistemas de informação em saúde, como o prontuário eletrônico, entram em cena trazendo camadas de segurança para a assistência que resultam em uma menor chance desses eventos sentinelas acontecerem.” 

Como o PEP é um dos caminhos para solucionar esse problema?

O Prontuário Eletrônico do Paciente desempenha um papel crucial na prevenção e no combate aos eventos sentinela de várias maneiras:

Registro preciso e abrangente de dados 

O PEP permite o registro completo e detalhado das informações médicas de um paciente, incluindo histórico médico, alergias, medicamentos prescritos e resultados de exames. Isso garante que os profissionais de saúde tenham acesso rápido a informações essenciais durante o atendimento, reduzindo assim o risco de erros decorrentes de dados incompletos ou imprecisos.

Acesso rápido a informações críticas

Com o PEP, os profissionais de saúde podem acessar as informações do paciente de qualquer lugar e a qualquer momento, desde que tenham autorização adequada. Isso é especialmente importante em situações de emergência, onde cada segundo conta e a capacidade de acessar rapidamente o histórico médico do paciente pode salvar vidas.

Suporte à tomada de decisão clínica

O PEP pode fornecer alertas e lembretes aos profissionais de saúde sobre medidas preventivas e protocolos de segurança específicos para cada paciente. Por exemplo, o sistema pode alertar sobre interações medicamentosas perigosas ou sobre a necessidade de realizar exames de acompanhamento após determinados procedimentos.

Rastreamento e análise de dados

O PEP permite o rastreamento e a análise sistemática de dados relacionados a eventos adversos e incidentes de segurança do paciente. Isso ajuda as instituições de saúde a identificar tendências, padrões e áreas de risco, permitindo intervenções proativas para prevenir a ocorrência de eventos sentinela no futuro.

Com o uso da tecnologia, a ocorrência de eventos sentinelas tende a diminuir justamente porque há mais informação disponível ao médico e sua equipe.

“Imagine medicamentos com grande potencial de causar danos à segurança do paciente. Para reduzir o risco de eventos adversos — ou até mesmo sentinelas — acontecerem a partir da administração errônea, é possível criar bloqueios no prontuário eletrônico que incluam, por exemplo, um mecanismo de dupla checagem antes de a enfermagem administrar a droga”, exemplifica Rafaela.

Checklist da cirurgia segura

Um aspecto importante na prevenção de eventos sentinela é a implementação de protocolos e checklists de segurança, como a Checklist da Cirurgia Segura desenvolvida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). 

“Ações como essa garantem que a informação correta chegue até a equipe assistencial a partir de várias camadas de checagem e rechecagem. E mais: quando o processo for delicado, é possível até mesmo construir mais passos necessários”, sugere a especialista. Já o chamado circuito fechado de medicamentos é outro formato indicado.

O PEP pode integrar esses checklists diretamente aos fluxos de trabalho clínicos, garantindo que cada etapa seja seguida rigorosamente antes, durante e após os procedimentos cirúrgicos. Isso ajuda a reduzir erros, complicações e eventos adversos associados à cirurgia, melhorando assim a segurança e o resultado para o paciente.

“Nesse caso, o medicamento só poderá ser administrado se, na hora exata da prescrição, as informações contidas na pulseira do paciente, no código de barras do medicamento e no crachá da enfermagem estiverem de acordo com as orientações contidas no prontuário eletrônico”, diz Rafaela, lembrando que essas consistências incluem até mesmo informações de internações passadas, como uma alergia a medicamentos, por exemplo, e possíveis interações medicamentosas.  

“Mas, para tudo funcionar adequadamente, o sistema deve estar atualizado com uma base de conhecimentos parametrizada para emitir os alertas de interação entre medicamentos, ou dose máxima permitida”, ressalta a CMIO, dizendo que o aprendizado na maneira de configurar os sistema aliado às novas funcionalidades deixa o prontuário eletrônico cada vez mais seguro.

Porém, para tudo funcionar perfeitamente e haver, de fato, a redução dos eventos sentinelas, as equipes devem estar treinadas para usar todas essas funcionalidades. Ou seja, método e mudança de cultura são fundamentais.   

Rafaela finaliza dizendo que não dá para pensar na prevenção de eventos adversos ou sentinelas na saúde sem o sistema de prontuário eletrônico.

“Atualmente, o sistema já permite até mesmo evitar a chamada variabilidade indesejada, que é quando a diferença na conduta médica prestada faz com que ela não seja ideal. E o prontuário eletrônico consegue evitar um possível erro de conduta terapêutica por meio da ferramenta de apoio à decisão clínica que emite alertas a cada decisão tomada pelo médico e incluída em prontuário. Isso, além de tudo, ajuda a garantir mais segurança ao médico que está administrando os medicamentos”, resume a CMIO.