Maira Caleffi, presidente da FEMAMA, analisa como a tecnologia pode ajudar a ampliar o acesso das brasileiras ao diagnóstico precoce e, com isso, ter mais qualidade de vida e êxito no tratamento

A telessaúde, o contato virtual com o médico oncologista clínico, o monitoramento para o chamado às pacientes que não estavam comparecendo aos seus tratamentos radioterápicos. Todas essas formas de uso da tecnologia que a pandemia disseminou são boas estratégias para o melhor cuidado com a paciente e podem, até mesmo, viabilizar o tão importante diagnóstico precoce de diversos tipos de câncer, inclusive o de mama.

Nesta seara, na visão de Maira Caleffi, presidente da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (FEMAMA), a Saúde brasileira, seja ela pública ou privada, precisa avançar na adoção de sistemas de laboratório mais completos e importantes e promissoras inovações precisam ser amadurecidas, como a inteligência artificial, da ciência de dados e do conceito que envolve a medicina personalizada.

Em entrevista exclusiva ao Blog MV, ela conta como o uso inteligente de sistemas para laboratório pode ajudar mais mulheres a terem um rápido acesso aos tratamentos e também avalia os desafios de infraestrutura que ainda precisam ser superados para que a tecnologia possa ajudar, ainda mais, num diagnóstico cada vez mais ágil.

Chegamos a mais uma campanha do Outubro Rosa e os desafios para o diagnóstico precoce do Câncer de mama ainda são muitos. Quais, na sua opinião, deveriam ser tratados com prioridade a partir deste ano?

Maira Caleffi: O maior desafio que enfrentamos neste momento é a descontinuidade de muitas mulheres em fazer seus exames de rotina. Por isso, neste ano de 2022, estamos fazendo um chamamento muito grande para que essas mulheres procurem seus médicos e façam seus exames. Em alguns estados brasileiros, a queda no volume desses exames chegou a 80% por causa da pandemia e, até hoje, os números de cobertura não voltaram ao patamar de 2019 — que já não eram excelentes.

“Em função da importância do diagnóstico precoce do câncer de mama, precisamos chamar todas as mulheres brasileiras a realizar seus exames de rotina. A partir dos 40 anos, todas devem realizar a mamografia, mesmo que não sintam nada. Esse é o protocolo para o rastreamento mamográfico”, Maira Caleffi, presidente da FEMAMA.

A tecnologia e a inovação, por sua vez, poderiam ajudar a resolver essas questões estruturais de prevenção e até de diagnóstico precoce, certo

Maira Caleffi: Certamente, a tecnologia e inovação podem mudar — e muito — o diagnóstico precoce do câncer no Brasil. Durante a pandemia, notamos que muitas mulheres ficavam perdidas no sistema de saúde sempre que precisavam de exames de investigação ou tratamento. Por isso, acho que uma das questões que a tecnologia pode nos ajudar é em relação à notificação compulsória. Por exemplo, se toda vez que um médico patologista identificar uma célula de câncer em uma biópsia ou no laudo anatomopatológico, é preciso ter um sinal de alerta no sistema para laboratório para que o especialista a receba no menor tempo possível. O mesmo sinal de alerta no sistema deve acontecer em mamografias com BI-RADS 4 ou 5, que é uma classificação internacional obrigatória para exames de imagem, para que a gente consiga identificar a paciente e fazer com que ela se mova muito mais rápido na jornada, por vezes morosa, do diagnóstico ao tratamento.

O que falta para que essas iniciativas possam ser expandidas para todo o Brasil?

Maira Caleffi: É preciso destacar que já existem iniciativas positivas no uso da tecnologia para esse fim do diagnóstico precoce, como é o caso do Hospital Pérola Byington (SP). Por lá, é possível confirmar o câncer de mama já na primeira visita da mulher à instituição. Isso porque se há suspeita de um tumor, a mulher já é encaminhada ao exame de imagem e pode receber o resultado da biópsia no mesmo dia, o que certamente ajuda a aumentar a chance de cura e diminuir a mortalidade pela doença. Ainda assim, esse exemplo não é a regra, e em muitas instituições a falta de infraestrutura de tecnologia se impõe e atrapalha o acesso e o tratamento adequado.

“O paciente oncológico precisa ter um sistema de informação ao seu redor, para que seus dados fiquem em um prontuário eletrônico para que ele possa ser atendido pela equipe multidisciplinar. O foco das políticas públicas
deveria estar na jornada desse paciente”, destaca.

Mesmo com essa importante questão do acesso, temos que reconhecer que está havendo um progresso importante na disseminação da tecnologia, em especial na medicina diagnóstica. O uso de inteligência artificial para encontrar achados radiológicos cada vez mais precoces é apenas uma dessas ações. Pode listar outras que estão sendo igualmente importantes?

Maira Caleffi: Eu diria que o uso da inteligência artificial para facilitar esses achados iniciais nos exames de imagem médica ainda está em uma fase precoce no Brasil, até mesmo na saúde suplementar. Mas essa é, sim, uma grande tendência que vai se juntar a outra que está ganhando corpo no tratamento das pacientes: a medicina personalizada.

E para o futuro, quais serão as inovações tecnológicas que, de fato, poderão ajudar os hospitais a proporcionarem diagnósticos e tratamentos mais eficientes a essas mulheres?

Maira Caleffi: O que eu gostaria de ver mais no futuro, em termos de tecnologia, é cada vez mais a ciência de dados trabalhar a favor dos pacientes. Temas como estruturação de dados e interoperabilidade de sistemas serão as grandes mudanças tecnológicas para o diagnóstico e tratamento do câncer de mama. Mesmo no SUS, é preciso usar mais os dados para identificar as reais necessidades e conseguir entender as fraquezas do acesso e como contar com uma melhor infraestrutura de Saúde, que seja capaz de impactar os altos índices de mortalidade que ainda existem hoje em dia.